sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Faltas

Sorriram para mim, mas era mentira. Eu, que vivo a ser confundida e a confundir-me, que vivo a cair nas ruas e em tentações. Era mentira. A leveza do sorriso não carregava toda a incerteza desse dia cinza e ninguém vai encaixá-lo, tão sincero, na minha blindada face ou vai oferecer em vão algo tão precioso a um destino tão errante.
Mas era um sorriso, de qualquer forma. Um sorriso de mentira, é fato, mas um sorriso alheio que só me fez refletir sobre o que pensam as pessoas que andam sozinhas nas ruas, como eu, mas sorriem para estranhos naturalmente, sem mensurar a seriedade de uma caminhada solitária ou as exigências de uma tarde cinza.
Fazia frio e uma garoa fina de inverno se acumulava nos meus cílios e o vazio inexorável, aquele que sempre está e sempre esteve comigo, mas em certas ocasiões explode e grita no meu peito, esse vazio companheiro e demônio tomou conta de mim e transbordou. Dentro de mim só havia uma pergunta, uma pergunta essencial que resumia toda a minha vida, todas as minhas lágrimas, todas as minhas palavras. A pergunta central, que não tem respostas nem expressão verbal, é sobre a leveza. Às vezes eu queria ter sentimentos pássaros como tantos outros e deixar pesar só aquilo que vale a dor. Mas as minhas dores não valem nem as razões nem as palavras. Não valem um sorriso. Por isso, era mentira.

“Eu...
Tive um passado? Sem dúvida...
Tenho um presente? Sem dúvida...
Terei um futuro? Sem dúvida...
A vida que pare de aqui a pouco...
Mas eu, eu...
Eu sou eu,
Eu fico eu,
Eu...”
Álvaro de Campos.

Um comentário:

  1. adorei os textos. já estou seguindo...se gostar segue lá tbm...
    enredodeideias.blogspot.com
    abçs..

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