quinta-feira, 30 de julho de 2009

Mais um Nada (de Amor)

Ninguém sabe como um amor começa ou como ele segue em frente e, nem por fim, como ele termina. Ele apenas surge, cresce e acaba. Como nós, mortais.
De uma forma ou de outra, ele acaba, nem sempre no sentido literal da palavra, mas em algum momento perde parte do significado que tinha no princípio.
E aos que discordam, sustentem suas idéias e creiam nelas. Não duvido nem nego, apenas tenho as minhas próprias opiniões, que não são a verdade absoluta do mundo, mas a minha verdade absoluta.
Em todo caso, eu e você sabemos que finito ou não, o amor é a coisa mais inacreditável da existência humana.
O amar e ser amado, é sobre isso que eu falo.
O fato de que entre bilhões de pessoas no mundo, duas se olhem como se fossem únicas. Que em bilhões de pessoas no mundo, só se queira uma e esta, por sua vez, queria quem a quer. Que exista uma coisa mais forte do que tudo, que é capaz de devastar e erguer universos inteiros. E que esta coisa esteja dentro das pessoas.
Tão soberano que não faz diferença entre cor, classe, crença ou qualquer outra ficção social. É amor. Para qualquer um em qualquer lugar é amor, tão amor para este quanto para aquele. Amor. Amor para qualquer um. Amor dos poetas, dos músicos. Das novelas e do teatro. Amor, sempre amor. Por toda parte ele surge, cresce e acaba.
Por toda parte quebra e reconstrói corações. Por toda a parte acontece ou é superado. Um problema e uma solução, por toda parte do mundo, por toda parte de nós.
Ele não é pouca coisa e não é por sentimentalismo barato que algumas palavras estúpidas tentam descrevê-lo, há séculos pessoas falam sobre isso. Há tempos que o tema favorito e dominante nas poesias é ele. O amor, seja como for, sempre ele. Séculos, séculos e séculos e ninguém se cansa de falar sobre ele, de ouvir falarem dele. Séculos e séculos e as donzelas continuam chorando, e os cavalheiros lutando. Séculos e séculos e eles ainda se beijam apaixonadamente no fim da história. Séculos, séculos e mais séculos e a idéia não muda. Mas quem disse que ela deve ser mudada? Nós a queremos assim, choraremos no fim, não importa quanto tempo passe. O amor é atemporal e anti-modismos, é e sempre será o centro das atenções.
Isso tudo porque o amor é forte. Muito mais do que forte, indestrutível. Quando um amor é real, ele é indestrutível, a maior das barreiras. E há ainda quem não creia nele, é possível? Há quem despreze seu valor. Protesto! É de todos os tesouros, todas as riquezas, toda a inteligência e beleza e tudo o que vale nesse mundo, exatamente tudo, a melhor e mais sólida grandeza de valor, porque todas, uma por uma dessas coisas sozinhas não são mais do que acessórios. Servem claramente para muita coisa, podem levar um ser humano ao mundo, mas nada disso faz com que o mundo importe de alguma forma para ele.
O amor faz sofrer. Nada no mundo causa tanto sofrimento quanto o amor. Ele pode ser duro, cruel. Pode acabar com grandes homens, desfazer uma pessoa. Pode ser o grande vilão de uma história. Pode ser a mais pura e insuportável dor que já existiu.
Mas ainda assim, é amor.
E se por um lado faz sofrer, por milhares de outros é a cura para qualquer sofrimento. É a paz e a tranqüilidade, o remédio, a sutura. É o respirar, o acordar. É o simples existir de quem ama e quem acredita que além do amor, nada mais é necessário. Ah, que virtude é sentir!
Que virtude é acreditar e viver no amor! Que dom é ser mais um poeta, mesmo sem palavras, que tem as poesias mais lindas escritas dentro de si. Ah, que virtude é sentir o que os outros não acreditam existir. Que dádiva é viver por alguém, e ter alguém que viva por si. Que beleza é o amor.
Afinal, se estamos aqui é por amor.
Se eu escrevo essas linhas, é por amor. Se você as lê, é por amor também. As coisas que fazemos por vontade própria são fruto do amor. Sim, estamos aqui por amor. E continuaremos, sempre que tivermos um amor para nos encorajar.


O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Alberto Caeiro.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Que Bela é a Chuva!

De onde estou escuto a chuva.
Ela cai lentamente, como um copo que se esvazia aos poucos para uma garganta. Bem sabes que a chuva não é lenta, que é forte e poderosa, mas se estás lento, ela será lenta para ti também. Bem sei que noto a chuva e ela, que está por toda a parte, não pode me notar. Que ela me molha como molha aos outros, que acaba no meu telhado como acaba nos outros. Tão essencial, tão sombria, tão indiferente, mas que bela é a chuva!
Tantas glórias dão os poetas ao sol e à lua que esquecem que as tempestades têm seus valores. Quando chove, a escuridão trás consigo um torpor que vem de dentro, ou até a boa e velha solidão que chega como um sopro que permanece e não cessa até que mudes de direção e saia de seu caminho. O vento e a solidão são algumas das melhores coisas da chuva.
De certo modo, vulgarizaram a solidão, assim como fizeram com a chuva.
Ela não é má, quem assim a julgou não sabe o que realmente significa. É tão bela quanto a chuva, tão válida quanto a umidade. Basta que a vejas como uma brisa leve, que vem junto com a chuva fina que cai nas ruas. Não é uma ventania se não surge de um temporal. Ah, o estar só! Tão suave e confortante que não me remete ao vazio.
Há quem diga que a chuva é tão dura quanto as lágrimas e a solidão tão cruel quanto um torturador. Não as condene, são de bem, eu sei que são. Não estão aqui para fazer sofrer, mas sim pra apagar um pouco as intensidades das idéias.
Não, não é preciso pensar quando chove. Abre a janela, ouve o leve estourar das gotas e sente a essência que exalam por onde passam. Não é claro nem colorido, não é animador nem alegre, mas é bom, de alguma forma que as palavras não podem dizer, é muito bom. Muitas coisas boas vão além do que dizem os poetas.

Num dia no meu futuro em que chova assim também
E eu, à janela de repente me lembre do dia de hoje,
Pensarei eu "ah nesse tempo eu era mais feliz"
Ou pensarei "ah, que tempo triste foi aquele"!


Álvaro de Campos.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Das Lembranças às Cicatrizes.

Dos amores e dos sofrimentos que viveu, não lhe sobrou um só retalho, um pequeno detalhe que fosse. Não guardou presentes nem memórias, tentou esquecer-se de tudo como vinha fazendo com a vida. Não quis lembrar-se de nada, não queria dores nem rancores, queria apenas partir livre para viver novamente. Contudo, em algum momento de sua história, ele quis rever os passos de seu caminho, mas estes já não faziam parte de si. Sem dar chances ao arrependimento, convenceu-se de que havia feito a coisa certa e seguiu em frente, fingindo não estar ferido pelas escolhas feitas, mesmo que em certos momentos se remoesse por dentro. A seu ver, era o melhor a fazer. Seguir em frente, sempre.
Não, não o julguem leviano.
Memórias, o que são? Por que as guardar com tanta fidelidade e devoção? Para que de fato as ter? Ele tinha as respostas, e eram válidas para erguer seus princípios: nada, por nada, para nada. E quem há de culpá-lo? Talvez alguém que nunca tenha parado para analisar muitas coisas que faz, vive e consente, ou um dos seus amores esquecidos e talvez eu, ou qualquer outro que tenha a mania de se colocar em histórias alheias ou queira colocar o mundo todo nos seus conceitos inválidos.
Mas nenhuma dessas pessoas de fato importa. Felizes daqueles que erguem seus princípios e têm a coragem de crer neles sem dar valor às acusações alheias. Só por fazê-lo já são grandes pessoas. Ir contra os padrões, viver de outra maneira, ser você mesmo com suas crenças e valores é o tipo de coisa que só os fortes são capazes de fazer. Os outros sim são vítimas banais dos costumes, das memórias, deste grande e insensato molde no qual fomos inseridos ou nos inserimos, e mesmo estes, quem há de culpá-los?
Se não acredita nas lembranças, não as cultive.
Se não acredita no amor, não ame.
E se no fim de tudo não acreditar na morte, viva, apenas viva.
Só não se coloque numa redoma criada por suas idéias nem pense que ela é segura, pois talvez um dia, assim como aquele que não queria lembrar-se de nada, você sinta vontade de viver o que não faz parte dela e será difícil libertar-se.
O passado pode ferir e certamente doerá, mas no fim de tudo, toda ferida vira uma cicatriz, cicatrizes são histórias e histórias sempre são coisas boas.


Sim, o mistério do tempo.

Sim, o não se saber nada,
Sim, o termos todos nascido a bordo
Sim, sim, tudo isso, ou outra forma de o dizer...

Realidade, Álvaro de Campos.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Às Duras Decisões.

Um dia, quem sabe, ela se decida por não sonhar mais. E quando os raios deste dia a atingirem, ela verá que já não é mais uma criança e que deve pensar como uma pessoa séria, usando a racionalidade e calculando a vida meticulosamente, sem deixar-se levar pela imaginação que há tempos regia seus caminhos ou pelas vontades de menina que tinha em seus sonhos. Alguém lhe dirá que já era em tempo, que esta é a decisão que todos devem tomar numa certa altura da vida, mas ninguém lhe dirá que ser sério em tempo integral não é uma virtude e sim uma perda inestimável da vida.
Então, enquanto estiver se reeducando para não mais ver o mundo por uma bolha cheia de cores e sons falsos, alguém ao seu lado estará aproveitando toda a magia e todo o encanto que vai além do que os olhos podem ver, e talvez este alguém sorria para ela. Ela não sorrirá de volta, pois não é o que se espera que uma pessoa séria faça. Sofrerá por não ser o alguém, e talvez até tenha vontade de voltar atrás e ser mais uma vez a menina que acreditava nas fadas e na bondade, mas antes que o saudosismo a possua por inteiro, o mundo real a chamará de volta para as coisas sérias que lhe dizem respeito.
E ela certamente irá sofrer e chorar, pois quem lhe disse que os sonhos não serviam de nada ocultou a necessidade mórbida que todo ser humano tem de sonhar acordado com o mundo irreal e ideal. Ninguém lhe disse que os sonhos fortalecem e que a ausência deles faz de uma pessoa uma rocha oca, forte por fora, mas sem nenhum valor por dentro, fraca e inútil para os outros para si mesma.
Com o tempo, ela verá que decisões nem sempre são definitivas e que a coragem de voltar atrás e refazer a própria história é uma virtude e tanto. Olhará então para aquele alguém que sabia ver a vida do jeito que ela sempre quis e pedirá ajuda. Verá que pedir ajuda também é coragem e se irá sentir-se forte e indestrutível. Aos poucos, deixará de lado suas vãs convicções e idéias manipuladas, voltará a sorrir para a vida e não mais irá basear-se em números, mas sim em sentimentos. O alguém sorrirá mais uma vez e agora ela estará pronta para sorrir de volta com toda a sinceridade, alegria e o infinito de sentimentos bons que cabem num sorriso.
Sim, os sonhos perdidos podem ser reencontrados.
Sim, a vida perdida pode renascer.

Tudo o que ela precisa é ser livre como uma criança, sonhando como gente grande.

Adeus para sempre, rainha das fadas!
As tuas asas eram de sol, e eu cá vou andando.
Não estarei bem se não me deitar na cama.
Nunca estive bem senão deitando-me no universo.

Tenho, Álvaro de Campos.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Começando pelo Fim.

Ele podia buscar o mundo, mas não quis.
Ele podia estar num outro mundo, mas também não quis.
Ele podia ter sido muitas coisas, mas não foi nenhuma delas.
Tudo o que ele quis foram aqueles olhos que o fizeram achar que conquistaria o mundo, que estaria num outro mundo e que seria muitas coisas. Acreditou tanto neles que esqueceu que nada aconteceria sem o seu primeiro passo. Envolveu-se tanto na sua luz que se esqueceu das trevas, que estavam por toda parte.
Mesmo assim, viveu da luz e não se afastou dela até que toda a luminosidade, que o mundo julgava efêmera, enfim partiu e o deixou na penumbra que ele se recusava a enxergar. Seu mundo era tão pequeno que quando caiu não gerou o mínimo estrondo. Caiu em silêncio, leve e suave como uma folha de papel, e se em algum momento pensou ter sentido alguma dor, notou que ela era apenas mais uma das inúmeras fantasias que criara em volta de si. Não, a dor não existe. A fraqueza e a falta de coragem são reais, mas a dor pelo fim é pura imaginação, pois ele já não era mais nada e não se destroem ruínas uma vez que elas já estão praticamente destruídas. Os olhos que lhe fizeram achar que suas ruínas eram castelos já não faziam mais parte dele e não podia agir como se fizessem.
Porém, quando tentava recompor seus pedaços, viu que ruínas têm tanto valor quanto castelos. Apesar de derrotadas, ainda existem e intrigam já que um dia foram algo para alguém. E por mais que demore, um dia todo castelo nada mais será que uma ruína, triste e fraca das coisas que já lhe fizeram grande. Partindo disso, decidiu então não restaurar-se dia após dia, não no mesmo lugar, pois aquele já era seu patrimônio histórico e não era ético tocar nele.
Não, não irá se reconstruir.
Fará melhor, no espaço que lhe sobrou, criará um projeto novo, com vista para o antigo, para que nunca se esqueça deste nem de quão belo foi, mas saiba sempre que de fato após a tempestade vem a bonança e que sempre terá forças para erguer não só castelos, mas reinos inteiros.


Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes
Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas,
Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu.

Grandes, Álvaro de Campos.